quarta-feira, 24 de junho de 2009

Começamos ao contrário

Ao contrário do que é devido, do que se pretende, do que se deve mas nunca, e digo nunca com toda a afirmação que esta palavra transporta, ao contrário do que se sente. Estamos aqui e deviamos ter estado sempre ali, caminhamos nesta direcção e a que deviamos ter seguido sempre era a outra, falamos quando deviamos permanecer em silêncio e sempre que alguma coisa devia ser dita, há uma uma força que nos cose os lábios e torna muda a nossa eloquência sentimental. Creio na força que nos uniu, que nos mantem juntos e que faz com que a cada momento avancemos no olhar do outro. Quero congelar, um a um, cada momento, para que nunca percam a intensidade, o aroma e a frescura do que sinto.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

A presença na minha ausência*

Este não pertende ser um *'livro de mágoas', nem uma *'bíblia de tristes' ou sequer testemunhos desventurados. Abençoados são aqueles que desgarram os momentos de dor, ansiedade e saudade porque as sombras que nos seguem, as que criamos e a nossa própria fazem-nos já sentir. São estes os que ficam sempre que outros permanecem apartados. A distancia é para além de uma emoção, faz sentir-se como um objecto frio, de cor metálica e arestas cortantes. Vai entranhando e fazendo substituir-se ao sangue quente e vermelho que corre languido na espera do regresso, *'e a minha boca tem uns beijos mudos,' *'e as minhas mãos, uns pálidos veludos'. É assim que permaneço. É importante que continue, permanecendo. Temporariamente só, temporariamente longe, temporariamente. Que fiquem as desilusões, os orgulhos, as horas, os anos mas as nossas bocas, que fiquem sempre juntas. Quero fazer de um sim,* uma certeza de que nem sitio ou flor se aconcheguem primeiro a mim e que não deixaremos o nosso sabor.

*Florbela Espanca - poemas

* Sara Tavares